terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Para nos Entender um Pouco

A primeira pergunta que sempre se faz para um gaúcho quando não agüenta mais ouvir ele discursar sobre as vantagens e maravilhas do Rio Grande é: “Mas afinal, por que você saiu de lá?!” Geralmente a resposta é dada em tom de deboche, com um certo ar de superioridade : “Por que onde tem muito gaúcho, ser gaúcho não é vantagem!!”
Brincadeiras à parte, esta afirmação tem um pouco de verdade. Calma, não me entenda mal, não quero dizer que somos super-homens de bota, bombacha e bigodão ou algo parecido, mas que o nosso querido estado está saturado de mão-de-obra especializada, com um mercado agressivo em que não basta competir, é preciso possuir um diferencial (palavra muito em moda por lá), algo que ainda não tenha sido pensado pelos concorrentes e que, ao ser usado, será certamente imitado por todos, deixando logo de ser novidade, abrindo espaço para que outra idéia inovadora seja criada, imitada, e assim por diante, num eterno canibalismo comercial.
Acha que eu estou exagerando? Tenta criar um negócio em Bagé! Inaugura uma loja em Porto alegre! Abre um escritório no Alegrete! É muito difícil entrar no mercado do Sul justamente por que lá tudo já foi feito ou inventado, que até criatividade e paciência têm limite.
Então a gauchada, para evitar ter de agarrar cliente à unha na rua e jogar para dentro da loja, se toca para o Norte, promessa de futuro, com um mercado absorvente, em que a peleia pelo consumidor ainda não é a tapa, podendo produzir, vender e crescer sem perder o sono. Com a vantagem também de aqui ter água de coco e tapioca, e a desvantagem de não ter lareira nem o Galpão Crioulo no domingo.
Outra coisa que me chamou a atenção foi o alto grau de “engauchamento” do pessoal do Sul por aqui. Parece que quanto mais longe o gaúcho fica de casa, mais gaúcho ele fica, mas tem gente que exagera: tem índio que nunca disse um “buenas” na vida e anda falando mais grosso que ronco de maverick, ouvindo Mano Lima e decorando os cortes da vaca para parecer que entende de churrasco.
Esta é uma das mais interessantes facetas do pessoal do pampa: o gaúcho é um baita sentimentalista! Embora nenhum goste de admitir para não ser confundido com, digamos, outra coisa (não me animo a escrever o termo para não levar uma sova), são todos pessoas com coração de ouro, que por trás da fachada de machaõ insensível escondem uma alma de poeta que se engasga por qualquer coisa. Duvida? Experimenta colocar uma música gaúcha dessas que falam do Rio Grande ou uma poesia do Jaime Caetano Braum e cuida se o vivente não fica com olhar meio parado, suspirando que nem gaita velha furada.
A verdade é que gaúcho não corta o cordão umbilical – ele estica – fica sempre ligado com a terrinha. O sonho de todo gaúcho é voltar para o Rio Grande, só que depois de um certo tempo, ele vai passar uns dias por lá e não acha o frio tão bom assim, congelando o nariz e as orelhas, acha falta da rede embaixo do pé de cajueiro, os parentes que moram lá fazem troça do sotaque “cantado” que ele sem perceber “pegou”, vai pescar e só tira traíra ou jundiá que, apesar de saborosos, não têm a majestade do dourado ou brigam bonito que nem o surubim, e quando o qüera se dá conta ele está sentindo falta de ver um pouco de floresta grande, de pescar no “Madeirão”, de ouvir algum amigo do norte soltando um “vixi!” de exclamação por qualquer coisa. E quando o gaúcho assustado percebe, está com saudades do Norte, que lá nem é tão quente assim, afinal já inventaram ar condicionado e suco de caju e que o forró é tão bom quanto uma vanera. Descobre, entre triste e conformado, que o Rio Grande dele mora nos seus sonhos e dentro do seu peito e só é bom visitá-lo no durante poucos dias por ano. No verão.

3 comentários:

Bláh Limberger disse...

Escrevi isto pouco tempo depois de me fixar em Rondônia. Não sustento a opinião, os tempos mudaram, o Rio Grande deu uma melhorada e a economia da região deu sinais de vida. Voltei e não pretendo sair daqui, mas vamos ver como se desenrola a crise mundial...

Hackbarth disse...

Mas que o gaúcho fica mais gaúcho ainda quando sai do sul, isso continua sendo verdade.

Prof. Adm César Hundertmarck disse...

Tchê louco, que maravilha ! E que saudades do Sul ! Parabéns ! Adorei o que li ! Não sabia que escrevias maravilhosamente bem !
Abraços do Gaúcho perdido no Norte e....te digo: Aqui em Parintins é bem Norte mesmo...RO é fichinha !
César Hundertmarck